Mostrar mensagens com a etiqueta sexo. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta sexo. Mostrar todas as mensagens
quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015
O que as 50 Sombras de Grey trouxeram à Luz
Veja a leitura psicológica do fenómeno AQUI (Entrevista na TVI 24)
e
Leia o artigo sobre o tema AQUI (Sexo: Das Sombras à Luz - Revista Visão)
A sexualidade não tem idade. Tem diversidade. E muitas formas de expressão, movidas por razões igualmente diversas. Pelo prazer da descoberta, por pura diversão, por uma questão de preferência ou como via de transformação pessoal.
Sempre tem sido assim, mas vivido na sombra. Daí que, de tempos a tempos, venha à tona uma música, um livro ou um filme que se converte num fenómeno social e mediático. Que destrone ideias feitas acerca do que é o Normal, o prescrito, em matéria de jogos entre adultos. Cada tempo e transição social e de costumes tem os seus ícones, agents provocateurs incluídos.
Década a década, costumes e práticas de imensas minorias vão saindo do armário. Nesta, a era da tecnologia, do marketing e da globalização, o desafio é dar permissão ao BDSM para entrar, sem culpas nem o rótulo de perturbação mental, na domesticidade conjugal e na vida de cada um. Com aceitação social, portanto.
Será esse o «segredo» da trilogia da best seller americana E L James (e da versão cinematográfica)? BDSM goes mainstream? Como ficção que é, não podem deixar de lá estar os ingredientes clichê que prendam o espetador (as espetadoras, já agora): as tormentas secretas do herói poderoso e as vicissitudes da jovem que se apaixona por ele. Nada de novo, apenas uma nota diferente: face a obras do género (romances, dramas ou thrillers eróticos), a «moral da história» promete ser menos fatalista. E, talvez até, fantasista.
sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014
Sexo: À minha maneira
Pesquisa portuguesa inédita revela: ter uma atitude positiva após um fracasso íntimo aumenta a resistência psicológica e melhora a vida sexual, enquanto que dramatizar só piora.
Sabia que pode tornar a sua vida íntima mais rica ou convertê-la num inferno, consoante o seu tipo de dieta? Não é dessa alimentação que estamos a falar. Os pensamentos e emoções são ingredientes que fazem toda a diferença durante a resposta sexual.
O Laboratório de Investigação em Sexualidade Humana (SexLab), na Universidade do Porto, divulga, em exclusivo para a revista VISÃO, os resultados de um estudo inovador, apresentado recentemente no Congresso da Sociedade Europeia de Medicina Sexual, em Istambul, na Turquia. O estudo - Resposta Sexual Perante Falso Feedback Negativo - pretendeu apurar em que grau as variáveis psicológicas interferem no aparecimento de dificuldades sexuais.
A equipa coordenada pelo psicólogo Pedro Nobre recriou, em ambiente experimental, uma situação que a maioria de nós terá já experimentado na vida real: receber uma informação negativa acerca do seu desempenho. A meta: saber como os participantes lidavam com essa mensagem, desconhecendo que era falsa.
Os 160 voluntários - heterossexuais jovens (média etária situa-se nos 23 anos) e sem problemas sexuais - foram convidados a visionar, individualmente, um filme de três minutos com cenas de sexo explícito, enquanto lhes era medida a resposta sexual, em tempo real (através de dispositivos colocados na zona genital, ligados a computador). A seguir, eram informados, via intercomunicador, de que a sua reação sexual era inferior à média.
Após visionarem o segundo filme, as reações físicas e psicológicas foram avaliadas e comparadas com as do grupo de controlo (que não recebeu a informação falsa). Os resultados foram surpreendentes e com maiores implicações no sexo masculino.
Atitude positiva
Atitude positiva
A pesquisa, que recria artificialmente uma situação de insucesso sexual, mostrou que ambos os sexos relataram, em média, ter sentido menos prazer e excitação no segundo filme (após a "má noticia"). Porém, esse impacto não se traduziu na resposta fisiológica, que se manteve sensivelmente a mesma nas mulheres (vasocongestão vaginal) e com algumas alterações negativas nos homens (ao nível da ereção).
As diferenças relatadas individualmente deveram-se, sobretudo, aos pensamentos eróticos e emoções positivas: uns e outros tendem a reduzir o impacto da situação incómoda ou desagradável, na intimidade. "A forma como as pessoas lidam com as experiências sexuais negativas determina as suas repostas no futuro", esclarece Pedro Nobre. Ou seja, manter ou promover uma atitude favorável numa situação adversa permite ganhar resiliência. O contrário - catastrofizar, por exemplo - traduz-se em "mais vulnerabilidade para desenvolver dificuldades sexuais a posteriori".
Assim, no momento de perguntar "gostaste?", afirmações aparentemente inócuas, como "mais ou menos" ou "nem por isso", podem revelar-se particularmente mortíferas, especialmente se quem recebe a mensagem tiver pouca "fibra" psicológica para aguentar o desafio.
O mito da perfeição
O mito da perfeição
Em ultima análise, a perceção subjetiva de prazer é condicionada pelas nossas crenças. O estado de saúde das nossas vidas privadas parece, contudo, ameaçado pelo "vírus" das crenças irrealistas que continuam a vigorar na sociedade atual. A saber: "No caso do homem, a ideia do macho latino, que nunca falha na cama, com posição e estatuto, etc; na mulher, exigências como satisfazer o parceiro, ser sexualmente ativa, ter orgasmo durante o coito, e de preferência mais que um, além de ser boa no trabalho e no lar." Apetece perguntar se ainda faz sentido a dupla icónica Ken & Barbie (convertida em Bimby, na Era multitarefa).
Estes mitos parecem constituir fatores de risco para, mais cedo ou mais tarde, vir a desenvolver dificuldades sexuais. A pensar na melhoria dos tratamentos psicológicos para lidar com elas, o SexLab tem novo estudo a decorrer na consulta de sexologia da Universidade de Lisboa, que pressupõe o acompanhamento gratuito a homens com disfunção erétil.
VEJA as FOTOS em Visão Online (publicado em 12.02.2014)
segunda-feira, 8 de julho de 2013
Amor em Tempos de Cancro
O que deve saber sobre sexo durante o tratamento oncológico e pistas para redescobrir a sensualidade.
Artigo realizado para a revista Visão (nº 1061) - Junho de 2013
domingo, 10 de março de 2013
O Meu Corpo e Eu
Encontrar significado para sintomas pouco comuns é um
exercício de descoberta pessoal, que a ciência só parcialmente explica e a
sociedade nem sempre aceita
Duas mulheres famosas, uma romancista e outra activista, entenderam
ter uma palavra a dizer sobre o que se passava no estranho mundo dos seus
corpos, aos quais «aconteciam coisas». Dessas, que as ciências médicas
diagnosticam e tratam, e de outras, menos óbvias. É humano: o sintoma tem
sempre razão. Descobri-la é outra história. A ser bem contada, pode acabar nas
páginas de um livro.
«Em Maio de 2006, sob um céu azul e sem nuvens, ali
estava eu [Minnesota, EUA] para discursar sobre o meu pai, que morrera dois
anos antes. Assim que abri a boca, comecei a tremer violentamente. Tremi nesse
dia e tremi outra vez, noutros dias. Eu sou a mulher que treme.» Assim termina
o ensaio The Shaking Woman or A History
of My Nerves (2010), da autoria da escritora americana Siri Hustved, companheira
do também escritor Paul Auster. A experiência, aos 51 anos, abalou-a
profundamente. Tudo correra bem na elegia fúnebre: «Quando chegou a hora, li o
que tinha preparado, numa voz forte, sem lágrimas.» Agora, diante de uma
plateia de convidados, no lugar onde o pai tinha sido professor universitário
durante quatro décadas, também conseguiu ler o discurso até ao fim, mas incapaz
de controlar o seu corpo a tremer, da zona do pescoço para baixo.
Durante dois anos, Siri dedicou-se, com afinco, à procura
da explicação para o «estranho» que habitava nela, qual «duplo», que podia
manifestar-se à revelia da sua vontade, do seu Eu. Procurou ajuda na medicina
convencional e complementou a sua investigação com memórias e episódios biográficos
marcantes.
A hipótese de luto tardio estava fora de questão. Freud
poderia diagnosticar histeria (hoje, perturbação de conversão). O psiquiatra
equacionou uma desordem de pânico. O neurologista quis despistar a
possibilidade de epilepsia.
http://sirihustvedt.net/57 anos, ascendência norueguesa
Doutorada em literatura inglesa, nos Estados Unidos
Romancista e ensaísta
Traduzida em 29 línguas, recebeu vários prémios
Casada com o escritor Paul Auster, a viver em Nova Iorque
Insight: «Ser doente depende do temperamento, história pessoal e cultura em que vivemos»
As ressonâncias magnéticas que não acusaram nada. A solução para manter os malditos «ataques» sob controlo era tomar medicamentos beta-bloqueantes. A certa altura, a autora confessa ao leitor: «Fui seguida por uma psicanalista e uma neurologista, mas nenhuma me disse quem era a mulher que treme.»
Siri foi à procura dela. Frequentou, até, um grupo de
neuropsicanálise e conheceu as pesquisas sobre neurónios-espelho, responsáveis
pela empatia (sentir-se na pele do outro). Aí estaria, segundo ela, a chave do
enigma. Na última semana de vida do pai, Siri pensava nele, antes
de dormir, quando foi invadida pela sensação física de alguém com enfisema
pulmonar. «Como ele, senti a proximidade da morte.» O pai autorizara que ela
usasse memórias suas no livro As
Tristezas de um Americano (2008). A filha chegou a teclar cartas dele, combatente
na II Guerra, para interiorizar fisicamente o sentimento dos flashbacks descritos.
O envolvimento emocional intenso com a escrita paterna
pode ter estado na origem do «ataque». Quando ela se preparava para dar voz às
palavras, deu-lhes corpo. «A história da mulher que treme é a narrativa de um
evento que se repete e vai ganhando, ao longo do tempo, múltiplos sentidos, consoante
a perspectiva.» Podemos não controlar o que nos acontece, mas faz toda a
diferença ligar pontas soltas do «Eu» nessa história, e conta-la, de forma
articulada, a um «Tu».
Um dia, a mente deixa de responder ao que se passa no
corpo e tudo parece perdido. Ou ganho, depois de passar pela experiência, com
uma visão renovada. Para a activista política Naomi Wolf, autora do best seller
O Mito da Beleza, nos anos 90, o «click» deu-se aos 46 anos. «Enquanto fazia amor, e
nos momentos seguintes, deixei de sentir-me física e emocionalmente conectada
e, em vez disso, sentia uma dormência interna». Este foi o ponto de partida
para o seu novo livro, Vagina: A Cultural
History. Num artigo ao jornal britânico The
Sunday Times, Naomi afirmou que o seu problema foi uma oportunidade para
ganhar uma nova consciência sexual, com a ajuda clínica, mas não só.
A jornada começou no gabinete de ginecologia. Os testes
ditaram o diagnóstico: doença degenerativa na lombar, pela compressão vertebral
nos pontos L6 e S1. A lesão, originada por uma queda, duas décadas antes, nunca
tinha dado dores, até bloquear parte do nervo pélvico (que envia impulsos ao
cérebro, activando a química do prazer e do amor). Daí a dormência e falta
daquela euforia pós-sexo. A cirurgia era parte da solução. Na consulta com o
especialista Jeffrey Cole, Naomi ficou a conhecer algo novo: «Cada mulher tem
um nervo pélvico diferente; algumas ramificações centram-se mais na vagina,
outras no clítoris ou, ainda, no períneo, o que explica as diferenças
individuais da resposta sexual feminina.»
Sem estar à espera, Naomi encontrou a resposta para o
clássico drama da insatisfação feminina. Se as diferenças nas terminações
nervosas pélvicas são puramente físicas, deixa de haver discussão sobre
orgasmos de primeira e de segunda. O mistério está na anatomia e circuitos neurais
de cada mulher. Isto é algo que devem gostar de saber as 30% de mulheres
ocidentais que referem não ter prazer com o sexo. «Em vez de julgar-se ou
culpar-se por algo não funcionar consigo, explore as suas ligações neurais e deixe-se
guiar por elas.»
O prazer de fazer amor e o sentimento de êxtase 2-em-1, voltaram.
Depois do alinhamento das vértebras, Naomi recuperou, em alguns meses, a
sensibilidade que julgava perdida. Durante esse tempo, quis aprofundar o assunto
e frequentou os cursos de Mike Lousada, um terapeuta de sexo tântrico. «Os
tântricos abordam a sexualidade feminina com respeito, como se fosse sagrada», revelou
à imprensa. Na sua obra, disserta sobre o potencial do órgão sexual feminino, uma
porta de entrada para o autoconhecimento e a comunhão mística.
As críticas não se fizeram esperar. Numa edição do The Guardian, por exemplo, ironizava-se com
a mulher em crise da meia-idade que usava a
ciência a gosto, para legitimar questões de ego.
naomiwolf.org
50 anos, ascendência americana e romena
Formou-se em Artes e
Literatura Inglesa, nos Estados unidos
Autora, jornalista e defensora
da liderança e libertação sexual das mulheres
Foi consultora de Al Gore e
Bill Clinton nas suas campanhas presidenciais
Vive com o produtor de cinema
Avram Ludwig
Insight: «As mulheres americanas têm sido tão controladas por
ideais e estereótipos como por limitações materiais»
Naomi Wolf, a mulher que personificou o movimento
feminista de terceira geração, nunca escondeu as suas posições acerca do corpo,
da vida privada e das questões de consciência social, por mais controversas que
fossem. O gigante Apple também não escondeu que, em pleno século XXI, censura
palavras como a que titula o livro. Na sinopse pode ler-se: «V****a. Um
trabalho surpreendente que muda radicalmente a forma como pensamos acerca da
v****a». Ironicamente, o texto termina com a autora a interrogar «porque é que,
mesmo num mundo cada vez mais sexualizado, a v****a é vista como uma ameaça, ou
se pensa nela como algo ligeiramente vergonhoso».
Nas redes sociais, alguns dos comentários destacaram o paradoxo:
se é de um termo médico que estamos a falar, como querem, afinal, que lhe
chamemos?
Texto publicado na Revista Máxima (Fev 2013)
quarta-feira, 18 de maio de 2011
Sexo, querida hoje não me apetece
Por Clara Soares
Um em cada sete homens tem falta de apetite para os jogos de adultos. A culpa não é só da testosterona. Viagem a uma realidade camuflada, mas com janelas por onde espreitar. Confira o MANUAL DO DESEJO masculino
Preliminar: este artigo é para homens. Deles se diz que só pensam em sexo. Dietas, dores de cabeça é mais com as mulheres, embora sejam elas - a amiga, a parceira, a médica - que os ouvem desinteressadamente e dão dicas. "Não me apetece. E depois?" é coisa que não se partilha nos balneários nem se confessa ao melhor amigo. Agora, o prato principal: a diminuição do desejo sexual (entusiasmo, ou tusa, na gíria), que incita um homem à exploração e à ação (a tal performance).
Na última década, a falta de desejo no masculino tem sido alvo de estudos, no mundo inteiro, e é ténue a fronteira que separa a normalidade da disfunção. Vozes sonantes da Sexologia, como a de Irwin Goldstein, editor do Journal of Sexual Medicine, advertem que a escassez de apetite não é doença. Aquele investigador americano lembra que, estatisticamente, há sempre homens nos dois extremos da curva normal: "A minoria que tem apetite a mais e a outra, que tem desejo a menos." Os homens que falaram para esta reportagem, a maioria sob anonimato, consideram-se "dentro da norma", e apenas num caso houve recurso a ajuda médica, a conselho da mulher. Mas todos admitiram que o tema ainda é tabu.
Agora, os indicadores científicos: inicialmente, as estimativas apontavam para 2% a 10% de homens com Perturbação do Desejo Sexual Hipo Ativo (PDSH). Só que, recentemente, a fasquia tem vindo a aumentar também em Portugal. Atestam-no os médicos, que recebem mais queixas. E os investigadores, cujos estudos revelam que a PDSH é a disfunção sexual mais prevalecente no masculino (15,5 por cento). A que se deve a perda de libido, ou apatia sexual, como lhe chamam os urologistas em Espanha (onde aquele valor é idêntico)? A palavra aos cavalheiros.
"O meu manifesto de não querer fazer é explícito mas discreto." António, 41 anos, um empresário casado e pai de dois filhos, com residência em Évora, conta pelos dedos as vezes que o "não me apetece" ganhou. Por estar cansado. Ou "chateado e distante", a seguir a uma discussão conjugal. "Se já estou na cama, simplesmente não alimento nem reajo a estímulos, deixo-me estar." Desculpas também se usam, e não são as dores de cabeça. Na versão masculina, o "já vou" é a solução mais à mão e António conhece-a: "Simplesmente não me deito logo, leio ou trabalho em qualquer coisa." Nada de anormal, pelo contrário: é um ato de gestão da vida conjugal. Quando o outro está sempre ao alcance, o desafio é maior. António confirma-o: "Para ter sentido, a relação sexual tem de ser desejada por ambos e espontânea. Só devem ser provocadas as condições que facilitem a proximidade [estar sem os filhos e outras interrupções, do trabalho ao telemóvel].
"ESTAR 'OFF'
Quem disse que um homem não finge? A arte da camuflagem também consta do universo de um macho. "Já me aconteceu resguardar-me ou defender-me para perceber em que filme ia entrar. É uma forma de averiguar até que ponto a parceira está mesmo disposta a entrar no elenco." Aos 49 anos, o escritor Fernando Esteves Pinto desmente o mito do "sexo não, somos casados". Admite que o desinteresse ou indisponibilidade sexual não é um drama, até porque a experiência lhe diz que "as desculpas só complicam e levantam suspeitas sobre o parceiro". O problema da iniciativa sexual no casal, assegura, tem muito a ver com o tédio e a preguiça. Mas não lhe ocorre declinar o convite da mulher: "Funciono sem grande expressão de desejo e contribuo com um desempenho maquinal."
Se dúvidas houvesse, não faltariam estudos para validar a regra: um homem está sempre pronto, é-lhe fisiológico. Cientistas alemães, da Universidade de Hamburg-Eppendorf, verificaram que, contrariamente às parceiras de longa data, os homens casados manifestavam-se predispostos ao sexo regular, em qualquer estágio do relacionamento. Mas uma sondagem do Instituto de Opinião Pública francês, com mais de mil adultos, revelou outra versão da verdade sobre os casais gauleses: um em cada seis homens (nas mulheres, mais de uma em cada três) usou desculpas para não picar o ponto. "Os homens nunca falam destas coisas entre si", avança Miguel, um gestor desportivo divorciado. Aos 47 anos, a sua dieta perfeita é "dia sim, dia não", e nem o cansaço extremo o inibe. "O sexo relaxa-me." Com a mesma precisão, menciona as perdas de apetite, possíveis em três situações: "Estar com o pensamento noutra pessoa, por falta de energia - que o meu tempo de recuperação já não é o que era - e ausência de química."
Química é um termo que simplifica muito, sobretudo quando há que dar tampa. "Já recusei envolver-me com uma pessoa por falta de química." Assim fala Paulo, um alfacinha solteiro com 30 anos, que trabalha em telecomunicações. E é neste terreno que a falta de vontade se sobrepõe, ocasionalmente, à lógica das hormonas: "Quando alguma coisa no relacionamento me deixa pensativo, ou se me sinto intimidado quando ela tem mais desejo e eu receio não conseguir satisfazê-la."
'TU QUERES? EU TAMBÉM NÃO
'Num livro publicado há seis anos, o psiquiatra Francisco Allen Gomes, 67 anos, dedicou um capítulo ao aborrecimento sexual, tendo-se ficado a saber que "não se faz quando se quer, mas quando se pode", o que legitima o sexo sem desejo e o seu contrário. Fundador da Sociedade Portuguesa de Sexologia (SPS), Allen Gomes vai mais longe, afirmando que a falta de desejo é a disfunção-metáfora de um mundo que banalizou o sexo. Menos radical, o psicólogo Nuno Amado, 32 anos, assegura tratar-se de um sintoma ocasional. A exceção aplica-se "quando há uma depressão não identificada ou uma relação decadente". Já o stresse é a "desculpa de banda larga" para adiar o contacto, tanto por falta de paciência para satisfazer o desejo, como para evitar entrar em competição com uma mulher emancipada - que já teve outros parceiros.Aqui, talvez seja o momento de desmontar a máxima "Eles só pensam com uma cabeça", fazendo referência aos resultados preliminares das pesquisas do português SexLab, a funcionar há ano e meio. "Em média, nos nossos estudos, as mulheres afirmaram ter mais prazer subjetivo [ou bem-estar] do que os homens, o que não deixa de ser um enigma", considera Pedro Nobre, presidente da SPS e coordenador daquelas pesquisas. Psicólogo da Universidade de Aveiro, o especialista avança uma hipótese: as mulheres da amostra podem talvez pertencer a "um nicho minoritário, sexualmente liberal, com exigências por vezes excessivas". Este e outros inibidores psicossociais do desejo masculino - como a falta de tempo, as responsabilidades laborais e familiares, e o ritmo exagerado da sociedade moderna - contribuem, segundo Pedro Nobre, para a diminuição da vontade deles. Tais oscilações existem, igualmente, nos homossexuais. Duarte, 42 anos, é casado com outro homem e reconhece o cenário: "Tenho falta de apetite sexual e isso prende-se com o facto de eu ser uma pessoa de fases e nem sempre conseguir satisfazer o desejo do meu marido, ou não ter vontade, apesar de estar com uma ereção."
'HOMENS-ILHAS'
O urologista Nuno Monteiro Pereira, 50 anos e diretor da iSEX, Associação para o Estudo Avançado da Sexualidade Humana, tem acompanhado um crescente número de queixas na sua clínica. Uma pesquisa nacional que coordenou, em 2006, designada Episex, indicou uma prevalência de 15,5% na falta de desejo masculino, semelhante à de Espanha, onde o número de consultas pelo mesmo motivo cresceu 23%, em apenas cinco anos. "Sabemos que existe, mas cientificamente não sabemos porquê", diz o especialista. Mas a experiência clínica leva-o a especular acerca das causas: "Se for antes dos 28 anos, deve-se ao abuso de drogas recreativas, como o ecstasy, que destrói o sistema límbico [ligado aos instintos]. Se ocorrer acima dos 40 anos, será pelos efeitos secundários de medicamentos [antidepressivos, por exemplo]."
A baixa de testosterona - a hormona do desejo - é normal a partir da meia-idade, mas pode acontecer também pelo que se designa, diz Nuno Monteiro Pereira, de Síndrome Robinson Crusoe: quanto mais tempo se estiver sem atividade sexual, mais diminui a testosterona. "Trata-se de um mecanismo adaptativo para não sofrer, como sucede aos que estão sem parceira durante um ou dois anos." No balanço de causas encontra-se, ainda, "a péssima maneira como o novo homem encara a postura da mulher", por não conseguir aceitar a liberdade e autonomia dela, e medo de ser comparado com outros.
Os que procuram ajuda, geralmente pela porta da Medicina Familiar, fazem-no, quase sempre, por insistência da companheira. José Murta Cadima, 55 anos, clínico geral especializado em Sexologia, em Leiria, destaca as doenças como a diabetes e a hipertensão enquanto inimigos do desejo, pelos efeitos secundários da medicação, que comprometem a libido. Quando não é este o motivo, o caso fia mais fino no lar: "Elas costumam esperar que eles as procurem, sobretudo fora do meio urbano, mas, quando aqui vêm, chegam a questionar a orientação sexual do marido, quando este se vê apenas como um viciado em trabalho." Não admitem que lhes falta a vontade nem as questões conjugais mal resolvidas. Mas o corpo nunca mente: "Os níveis de testosterona, serotonina e dopamina baixam e o desejo vai-se."
'TRAGÉDIA Y'
A crónica incapacidade de lidar com os progressos do sexo oposto parece estar a fazer mossa no mito do macho alfa. Murta Cadima, de novo: "Eles ainda estão muito atrasados. Acompanhei alguns jovens com falta de desejo e disfunção erétil, que se sentiam inibidos, sem domínio sobre as namoradas, que tiram melhores notas, fazem o Erasmus e escolhas várias." Os mais velhos não estão melhor: muitos não passam sem o comprimido (Viagra, Cialis...), a arma de eleição para enfrentar o ambiente de caça nos bares, porque um homem não falha. Em alternativa, fogem.
"Fazem-se desentendidos, não atendem chamadas, optam por gratificar-se sem tanto esforço com cibersexo, evitando os rituais de sedução com destino incerto." Quem o afirma é o psicólogo Nuno Nodin, 37 anos, a concluir um doutoramento sobre sexualidade masculina e uso da internet. Também ele se refere ao novo homem, com um toque de ironia: "O interesse sexual é, para ele, uma entre outras comodidades que dão prazer, como o ginásio, os jogos e as saídas com amigos. Mas não deixa de ser uma masculinidade mais frágil."
Por enquanto, uma larga maioria lida bem com as variações da libido, quase sempre pontuais. Afirma-o o urologista Manuel Ferreira Coelho, 42 anos: "Os homens só não estão sempre prontos porque não podem - por exemplo, após uma cirurgia da próstata ou devido a problemas orgânicos [depois dos 50 anos]." Foi o caso de Bruno, 65 anos, gestor industrial reformado, durante um período em que tomou medicação que comprometia a ereção e o desejo. Apesar de ter voltado ao que era, "foi um período frustrante, até parecia que não gostava da minha mulher". Com aliança no dedo há 42 anos, não se inibe de afirmar que, "jovem ou menos jovem, um homem não é uma máquina que se programa como o gravador de vídeo". Praticante regular, mas sem dias certos, Bruno prefere a espontaneidade das pausas ao caráter obrigatório: "Quando há vontade, completamos o ato. Quando não há, paciência."
ANTIAFRODISÍACOS
As leis do desejo são imprevisíveis. E quem melhor do que o pintor, compositor e músico Manuel João Vieira, 48 anos, para dissertar sobre fastio? O homem que encarnou a personagem Orgasmo Carlos, e criou o álbum Romance Hardcore, dispara: "Às vezes há coisas tão simples como mudar de parceira e volta-se logo à normalidade sexual, apesar das questões morais." Importante mesmo é ter cuidado com certas armadilhas que, contrariamente às maleitas físicas, não terão remédio: "Eu, quando bebia, sabia que, depois de duas garrafas de uísque e um bagaço, a cabeça de baixo não fazia o que a de cima achava que podia fazer." Adverte os mais jovens para se conterem nas drogas e nas pílulas milagrosas: é que "não há bela sem senão..."
Por fim, um recado às senhoras. Francisco, 38 anos, um alfacinha solteiro e descomprometido, mostra como se pode arruinar uma hora de ponta: "O meu desinteresse caiu por completo quando, num primeiro dating, ela me disse em plena discoteca que contava às amigas tudo o que fazia na cama." A nega valeu-lhe boatos sobre a sua orientação sexual - a rapariga não encontrava outro motivo para Francisco não querer estar com ela. Ele lança o repto: "Porque é que um homem tem de aceitar uma rejeição com um sorriso e, se for ao contrário, o mesmo não se passa?"
De volta a Manuel João Vieira, também fundador dos Ena Pá 2000 e eterno candidato à Presidência da República, para um conselho útil aos homens da nação: "Alimentem a bravata, não se deixem deprimir e, já agora, digam às vossas parceiras para não se rirem de vocês quando estiverem a pôr um preservativo." Uma nota derradeira, para sobremesa ou digestivo. Perdoem, cavalheiros, o atrevimento de entrar em território só vosso. Mas alguma vez tinha de ser, e não há melhor propósito do que esta reportagem: "Primeiro, os senhores."
Publicado na Revista Visão
Um em cada sete homens tem falta de apetite para os jogos de adultos. A culpa não é só da testosterona. Viagem a uma realidade camuflada, mas com janelas por onde espreitar. Confira o MANUAL DO DESEJO masculino
Preliminar: este artigo é para homens. Deles se diz que só pensam em sexo. Dietas, dores de cabeça é mais com as mulheres, embora sejam elas - a amiga, a parceira, a médica - que os ouvem desinteressadamente e dão dicas. "Não me apetece. E depois?" é coisa que não se partilha nos balneários nem se confessa ao melhor amigo. Agora, o prato principal: a diminuição do desejo sexual (entusiasmo, ou tusa, na gíria), que incita um homem à exploração e à ação (a tal performance).
Na última década, a falta de desejo no masculino tem sido alvo de estudos, no mundo inteiro, e é ténue a fronteira que separa a normalidade da disfunção. Vozes sonantes da Sexologia, como a de Irwin Goldstein, editor do Journal of Sexual Medicine, advertem que a escassez de apetite não é doença. Aquele investigador americano lembra que, estatisticamente, há sempre homens nos dois extremos da curva normal: "A minoria que tem apetite a mais e a outra, que tem desejo a menos." Os homens que falaram para esta reportagem, a maioria sob anonimato, consideram-se "dentro da norma", e apenas num caso houve recurso a ajuda médica, a conselho da mulher. Mas todos admitiram que o tema ainda é tabu.
Agora, os indicadores científicos: inicialmente, as estimativas apontavam para 2% a 10% de homens com Perturbação do Desejo Sexual Hipo Ativo (PDSH). Só que, recentemente, a fasquia tem vindo a aumentar também em Portugal. Atestam-no os médicos, que recebem mais queixas. E os investigadores, cujos estudos revelam que a PDSH é a disfunção sexual mais prevalecente no masculino (15,5 por cento). A que se deve a perda de libido, ou apatia sexual, como lhe chamam os urologistas em Espanha (onde aquele valor é idêntico)? A palavra aos cavalheiros.
"O meu manifesto de não querer fazer é explícito mas discreto." António, 41 anos, um empresário casado e pai de dois filhos, com residência em Évora, conta pelos dedos as vezes que o "não me apetece" ganhou. Por estar cansado. Ou "chateado e distante", a seguir a uma discussão conjugal. "Se já estou na cama, simplesmente não alimento nem reajo a estímulos, deixo-me estar." Desculpas também se usam, e não são as dores de cabeça. Na versão masculina, o "já vou" é a solução mais à mão e António conhece-a: "Simplesmente não me deito logo, leio ou trabalho em qualquer coisa." Nada de anormal, pelo contrário: é um ato de gestão da vida conjugal. Quando o outro está sempre ao alcance, o desafio é maior. António confirma-o: "Para ter sentido, a relação sexual tem de ser desejada por ambos e espontânea. Só devem ser provocadas as condições que facilitem a proximidade [estar sem os filhos e outras interrupções, do trabalho ao telemóvel].
"ESTAR 'OFF'
Quem disse que um homem não finge? A arte da camuflagem também consta do universo de um macho. "Já me aconteceu resguardar-me ou defender-me para perceber em que filme ia entrar. É uma forma de averiguar até que ponto a parceira está mesmo disposta a entrar no elenco." Aos 49 anos, o escritor Fernando Esteves Pinto desmente o mito do "sexo não, somos casados". Admite que o desinteresse ou indisponibilidade sexual não é um drama, até porque a experiência lhe diz que "as desculpas só complicam e levantam suspeitas sobre o parceiro". O problema da iniciativa sexual no casal, assegura, tem muito a ver com o tédio e a preguiça. Mas não lhe ocorre declinar o convite da mulher: "Funciono sem grande expressão de desejo e contribuo com um desempenho maquinal."
Se dúvidas houvesse, não faltariam estudos para validar a regra: um homem está sempre pronto, é-lhe fisiológico. Cientistas alemães, da Universidade de Hamburg-Eppendorf, verificaram que, contrariamente às parceiras de longa data, os homens casados manifestavam-se predispostos ao sexo regular, em qualquer estágio do relacionamento. Mas uma sondagem do Instituto de Opinião Pública francês, com mais de mil adultos, revelou outra versão da verdade sobre os casais gauleses: um em cada seis homens (nas mulheres, mais de uma em cada três) usou desculpas para não picar o ponto. "Os homens nunca falam destas coisas entre si", avança Miguel, um gestor desportivo divorciado. Aos 47 anos, a sua dieta perfeita é "dia sim, dia não", e nem o cansaço extremo o inibe. "O sexo relaxa-me." Com a mesma precisão, menciona as perdas de apetite, possíveis em três situações: "Estar com o pensamento noutra pessoa, por falta de energia - que o meu tempo de recuperação já não é o que era - e ausência de química."
Química é um termo que simplifica muito, sobretudo quando há que dar tampa. "Já recusei envolver-me com uma pessoa por falta de química." Assim fala Paulo, um alfacinha solteiro com 30 anos, que trabalha em telecomunicações. E é neste terreno que a falta de vontade se sobrepõe, ocasionalmente, à lógica das hormonas: "Quando alguma coisa no relacionamento me deixa pensativo, ou se me sinto intimidado quando ela tem mais desejo e eu receio não conseguir satisfazê-la."
'TU QUERES? EU TAMBÉM NÃO
'Num livro publicado há seis anos, o psiquiatra Francisco Allen Gomes, 67 anos, dedicou um capítulo ao aborrecimento sexual, tendo-se ficado a saber que "não se faz quando se quer, mas quando se pode", o que legitima o sexo sem desejo e o seu contrário. Fundador da Sociedade Portuguesa de Sexologia (SPS), Allen Gomes vai mais longe, afirmando que a falta de desejo é a disfunção-metáfora de um mundo que banalizou o sexo. Menos radical, o psicólogo Nuno Amado, 32 anos, assegura tratar-se de um sintoma ocasional. A exceção aplica-se "quando há uma depressão não identificada ou uma relação decadente". Já o stresse é a "desculpa de banda larga" para adiar o contacto, tanto por falta de paciência para satisfazer o desejo, como para evitar entrar em competição com uma mulher emancipada - que já teve outros parceiros.Aqui, talvez seja o momento de desmontar a máxima "Eles só pensam com uma cabeça", fazendo referência aos resultados preliminares das pesquisas do português SexLab, a funcionar há ano e meio. "Em média, nos nossos estudos, as mulheres afirmaram ter mais prazer subjetivo [ou bem-estar] do que os homens, o que não deixa de ser um enigma", considera Pedro Nobre, presidente da SPS e coordenador daquelas pesquisas. Psicólogo da Universidade de Aveiro, o especialista avança uma hipótese: as mulheres da amostra podem talvez pertencer a "um nicho minoritário, sexualmente liberal, com exigências por vezes excessivas". Este e outros inibidores psicossociais do desejo masculino - como a falta de tempo, as responsabilidades laborais e familiares, e o ritmo exagerado da sociedade moderna - contribuem, segundo Pedro Nobre, para a diminuição da vontade deles. Tais oscilações existem, igualmente, nos homossexuais. Duarte, 42 anos, é casado com outro homem e reconhece o cenário: "Tenho falta de apetite sexual e isso prende-se com o facto de eu ser uma pessoa de fases e nem sempre conseguir satisfazer o desejo do meu marido, ou não ter vontade, apesar de estar com uma ereção."
'HOMENS-ILHAS'
O urologista Nuno Monteiro Pereira, 50 anos e diretor da iSEX, Associação para o Estudo Avançado da Sexualidade Humana, tem acompanhado um crescente número de queixas na sua clínica. Uma pesquisa nacional que coordenou, em 2006, designada Episex, indicou uma prevalência de 15,5% na falta de desejo masculino, semelhante à de Espanha, onde o número de consultas pelo mesmo motivo cresceu 23%, em apenas cinco anos. "Sabemos que existe, mas cientificamente não sabemos porquê", diz o especialista. Mas a experiência clínica leva-o a especular acerca das causas: "Se for antes dos 28 anos, deve-se ao abuso de drogas recreativas, como o ecstasy, que destrói o sistema límbico [ligado aos instintos]. Se ocorrer acima dos 40 anos, será pelos efeitos secundários de medicamentos [antidepressivos, por exemplo]."
A baixa de testosterona - a hormona do desejo - é normal a partir da meia-idade, mas pode acontecer também pelo que se designa, diz Nuno Monteiro Pereira, de Síndrome Robinson Crusoe: quanto mais tempo se estiver sem atividade sexual, mais diminui a testosterona. "Trata-se de um mecanismo adaptativo para não sofrer, como sucede aos que estão sem parceira durante um ou dois anos." No balanço de causas encontra-se, ainda, "a péssima maneira como o novo homem encara a postura da mulher", por não conseguir aceitar a liberdade e autonomia dela, e medo de ser comparado com outros.
Os que procuram ajuda, geralmente pela porta da Medicina Familiar, fazem-no, quase sempre, por insistência da companheira. José Murta Cadima, 55 anos, clínico geral especializado em Sexologia, em Leiria, destaca as doenças como a diabetes e a hipertensão enquanto inimigos do desejo, pelos efeitos secundários da medicação, que comprometem a libido. Quando não é este o motivo, o caso fia mais fino no lar: "Elas costumam esperar que eles as procurem, sobretudo fora do meio urbano, mas, quando aqui vêm, chegam a questionar a orientação sexual do marido, quando este se vê apenas como um viciado em trabalho." Não admitem que lhes falta a vontade nem as questões conjugais mal resolvidas. Mas o corpo nunca mente: "Os níveis de testosterona, serotonina e dopamina baixam e o desejo vai-se."
'TRAGÉDIA Y'
A crónica incapacidade de lidar com os progressos do sexo oposto parece estar a fazer mossa no mito do macho alfa. Murta Cadima, de novo: "Eles ainda estão muito atrasados. Acompanhei alguns jovens com falta de desejo e disfunção erétil, que se sentiam inibidos, sem domínio sobre as namoradas, que tiram melhores notas, fazem o Erasmus e escolhas várias." Os mais velhos não estão melhor: muitos não passam sem o comprimido (Viagra, Cialis...), a arma de eleição para enfrentar o ambiente de caça nos bares, porque um homem não falha. Em alternativa, fogem.
"Fazem-se desentendidos, não atendem chamadas, optam por gratificar-se sem tanto esforço com cibersexo, evitando os rituais de sedução com destino incerto." Quem o afirma é o psicólogo Nuno Nodin, 37 anos, a concluir um doutoramento sobre sexualidade masculina e uso da internet. Também ele se refere ao novo homem, com um toque de ironia: "O interesse sexual é, para ele, uma entre outras comodidades que dão prazer, como o ginásio, os jogos e as saídas com amigos. Mas não deixa de ser uma masculinidade mais frágil."
Por enquanto, uma larga maioria lida bem com as variações da libido, quase sempre pontuais. Afirma-o o urologista Manuel Ferreira Coelho, 42 anos: "Os homens só não estão sempre prontos porque não podem - por exemplo, após uma cirurgia da próstata ou devido a problemas orgânicos [depois dos 50 anos]." Foi o caso de Bruno, 65 anos, gestor industrial reformado, durante um período em que tomou medicação que comprometia a ereção e o desejo. Apesar de ter voltado ao que era, "foi um período frustrante, até parecia que não gostava da minha mulher". Com aliança no dedo há 42 anos, não se inibe de afirmar que, "jovem ou menos jovem, um homem não é uma máquina que se programa como o gravador de vídeo". Praticante regular, mas sem dias certos, Bruno prefere a espontaneidade das pausas ao caráter obrigatório: "Quando há vontade, completamos o ato. Quando não há, paciência."
ANTIAFRODISÍACOS
As leis do desejo são imprevisíveis. E quem melhor do que o pintor, compositor e músico Manuel João Vieira, 48 anos, para dissertar sobre fastio? O homem que encarnou a personagem Orgasmo Carlos, e criou o álbum Romance Hardcore, dispara: "Às vezes há coisas tão simples como mudar de parceira e volta-se logo à normalidade sexual, apesar das questões morais." Importante mesmo é ter cuidado com certas armadilhas que, contrariamente às maleitas físicas, não terão remédio: "Eu, quando bebia, sabia que, depois de duas garrafas de uísque e um bagaço, a cabeça de baixo não fazia o que a de cima achava que podia fazer." Adverte os mais jovens para se conterem nas drogas e nas pílulas milagrosas: é que "não há bela sem senão..."
Por fim, um recado às senhoras. Francisco, 38 anos, um alfacinha solteiro e descomprometido, mostra como se pode arruinar uma hora de ponta: "O meu desinteresse caiu por completo quando, num primeiro dating, ela me disse em plena discoteca que contava às amigas tudo o que fazia na cama." A nega valeu-lhe boatos sobre a sua orientação sexual - a rapariga não encontrava outro motivo para Francisco não querer estar com ela. Ele lança o repto: "Porque é que um homem tem de aceitar uma rejeição com um sorriso e, se for ao contrário, o mesmo não se passa?"
De volta a Manuel João Vieira, também fundador dos Ena Pá 2000 e eterno candidato à Presidência da República, para um conselho útil aos homens da nação: "Alimentem a bravata, não se deixem deprimir e, já agora, digam às vossas parceiras para não se rirem de vocês quando estiverem a pôr um preservativo." Uma nota derradeira, para sobremesa ou digestivo. Perdoem, cavalheiros, o atrevimento de entrar em território só vosso. Mas alguma vez tinha de ser, e não há melhor propósito do que esta reportagem: "Primeiro, os senhores."
Publicado na Revista Visão
sexta-feira, 28 de janeiro de 2011
O que querem as mulheres
Lutam para sair dos guetos para os quais a sociedade as empurram. Correm ainda pela igualdade. Querem sucesso e estão a tê-lo. Falta-lhes desembaraçar-se de alguns mitos e obter a cumplicidade (e a emancipação) dos homens
Por Clara soares
As mulheres têm mais que fazer,com as tarefas de sempre. As domésticas (uma minoria mais abonada só usa avental em ocasiões raras), as profissionais, os passatempos (nem que seja a saída semanal com as amigas ou o ginásio para manter a forma) e as compras. As roupas e os acessórios importam, seja porque as fazem sentir-se confiantes – ou compensadas por tantos deveres e afazeres. Não é por acaso que, segundo os estudos de mercado, elas surgem como as principais consumidoras de vestuário, serviços de estética, produtos de beleza e perfumaria. Mas como gerem elas, no quotidiano, a imagem de “supermulheres”?
São cada vez mais as mulheres que optam por viver sozinhas, sem que tal constitua um estigma social. Um estudo realizado no ano passado pela Pew Internet and American Life Project mostrou que o local de trabalho é o sítio onde a probabilidade de iniciar relacionamentos é maior (38 por cento). Porém, e de acordo com o mesmo estudo, mais de metade dos americanos solteiros (que representam 43 por cento da população adulta) não estão interessados – contrariamente ao que seria de supor – em encontrar a alma gémea. Uma atitude inédita, que costuma ser mais comum entre mulheres, divorciados ou viúvos.
Uma sociedade onde elas progressivamente conquistam influência e poder compromete – e bastante – o estatuto masculino, ao ponto de mexer com valores tão básicos como a virilidade. Será que também eles se sentirão tentados a gastar o dinheiro que elas ganham? Estarão dispostos a ficar em casa a tomar conta dos filhos e do lar, sem “perder a face”? E caso não estejam à altura de aceitar tal desafio, voltarão a correr para os braços de mulheres menos exigentes e poderosas, que os mimem e cuidem, sendo financeiramente dependentes deles?
O modelo da economia global deixa pouca margem para os conceitos de vida praticados nos anos 60, por exemplo, em que ainda era de lei a mulher ficar em casa e sobrava mais tempo para a vida conjugal. Hoje, essa área está em crise. Entre as muitas razões que levam ao fracasso do casamento tradicional, destaca-se a organização do trabalho. A tal ponto que a escritora e psicanalista francesa Corinne Maier se tornou famosa quando pôs o dedo na ferida. No seu livro Bom-dia Preguiça (versão francesa, 2004), lançou a polémica no meio empresarial, ao alertar os leitores para que façam o menos possível e não assumam responsabilidades no contexto laboral. Porquê? Porque nas empresas as pessoas se convertem em novos escravos, a quem se exige sempre mais a troco de um simples contrato de trabalho. A título de exemplo, refira-se que um executivo americano passa, anualmente, em média, 68 horas ao telefone e apenas 26 horas a ter relações sexuais.
O cenário tem uma dimensão expressiva nas grandes metrópoles do continente asiático: num universo repleto de gente anónima, os encontros assumem, com frequência, uma dimensão secundária relativamente às comunicações virtuais e às funções sociais de cada um.
No plano dos afectos, a realidade japonesa parece ter atingido um impasse, com cada vez mais mulheres solteiras – para quem a identidade já não passa por casar – e divorciadas. O cenário afigura-se temerário para o grupo dos homens casados, de tal forma que alguns decidiram criar uma associação para aprenderem a salvar os seus casamentos
No seu livro À Procura da Intimidade (Edições Asa, 2005), a psicóloga Maria Emília Costa explica por que é preciso que os cônjuges façam uma revisão das suas premissas de vida, de modo a não terem a impressão, tantas vezes incómoda e paralisante, de que investir na relação é sinónimo de perda de identidade.
Através dos casos que ilustram este dilema, a investigadora mostra como os modelos de intimidade espelham as regras com que aprendemos a amar desde a mais tenra infância – mesmo apesar da evolução dos modelos sociais, que defendem o crescimento individual. “Isto tem a ver com as heranças de valores, que se impõem ao discurso politicamente correcto”, esclarece a autora. Refere-se aos modelos culturais que são transportados para a educação. “Enquanto filhos, sabemos que é frequente, ainda, o pai perguntar ao filho adolescente quantas namoradas ele tem, mas se faz uma pergunta desse tipo à filha, é capaz de resumi-la ao singular (namorado)”, conclui. E isto “emperra” as melhores intenções liberalizantes, quer se queira quer não.
Este paradoxo entre ser igual e diferente, autónomo e dependente, afigura-se um verdadeiro quebra-cabeças para os homens. Alexandre Cruz Almeida, um brasileiro com 29 anos, com um site e um blog onde aborda com bastante humor as relações entre sexos, mostra, a partir de um detalhe quotidiano, aquilo a que chama esquizofrenia da mulher moderna: “Por um lado, a minha esposa quer que eu seja independente e saiba cuidar de mim; por outro, precisa que eu seja dependente dela – na forma como me apresento vestido, por exemplo – pois sabe que a sociedade a vai julgar como mulher se eu estiver com mau aspecto ou a camisa por passar.”
Em As Mulheres Querem Tudo , ele brinca com o facto de as mulheres emancipadas quererem por perto um homem Neandertal (forte e protetor), que seja também um gentleman, cheio de sensibilidade. “Elas nunca sabem que tipo de homem procuram, por isso escolhem um e tentam, em vão, mudá-lo; eles sabem exactamente a mulher que querem e não desejam que ela mude, reclamando logo quando elas querem mudanças.”
Voltando ao curso para homens, de Bob Gottfried – uma iniciativa que, por enquanto, não tem eco no nosso país –, pode revelar-se útil saber que “as mulheres querem sentir-se desejadas e precisas, falar de tudo um pouco com subjectividade, ter ao pé de si homens fortes mas que astratem com gentileza”. O mentor desta formação gratuita aconselha-os a fazerem aquelas pequenas coisas que eles não valorizam, mas que fazem toda a diferença para elas (arrumar o ketchup no sítio certo ou fechar a tampa da sanita, por exemplo). E dá algumas dicas para relaxar (exercícios respiratórios anti-stress), em vez de serem reactivos face a tais “miudezas”.
Se forem capazes de seguir o conselho – de homem para homem –, conseguirão que elas se sintam compreendidas e que façam por eles o que, no fundo, eles mais querem: “Serem reconhecidos por trabalharem a sério, serem poupados a sermões e queixas, terem o seu momento de sossego em momentos de stress, ter a graça de as ver fazer o que eles não gostam em casa, sair com os amigos e… claro, sexo.”
Excerto de artigo publicado na Revista Máxima
Por Clara soares
As mulheres têm mais que fazer,com as tarefas de sempre. As domésticas (uma minoria mais abonada só usa avental em ocasiões raras), as profissionais, os passatempos (nem que seja a saída semanal com as amigas ou o ginásio para manter a forma) e as compras. As roupas e os acessórios importam, seja porque as fazem sentir-se confiantes – ou compensadas por tantos deveres e afazeres. Não é por acaso que, segundo os estudos de mercado, elas surgem como as principais consumidoras de vestuário, serviços de estética, produtos de beleza e perfumaria. Mas como gerem elas, no quotidiano, a imagem de “supermulheres”?
São cada vez mais as mulheres que optam por viver sozinhas, sem que tal constitua um estigma social. Um estudo realizado no ano passado pela Pew Internet and American Life Project mostrou que o local de trabalho é o sítio onde a probabilidade de iniciar relacionamentos é maior (38 por cento). Porém, e de acordo com o mesmo estudo, mais de metade dos americanos solteiros (que representam 43 por cento da população adulta) não estão interessados – contrariamente ao que seria de supor – em encontrar a alma gémea. Uma atitude inédita, que costuma ser mais comum entre mulheres, divorciados ou viúvos.
Uma sociedade onde elas progressivamente conquistam influência e poder compromete – e bastante – o estatuto masculino, ao ponto de mexer com valores tão básicos como a virilidade. Será que também eles se sentirão tentados a gastar o dinheiro que elas ganham? Estarão dispostos a ficar em casa a tomar conta dos filhos e do lar, sem “perder a face”? E caso não estejam à altura de aceitar tal desafio, voltarão a correr para os braços de mulheres menos exigentes e poderosas, que os mimem e cuidem, sendo financeiramente dependentes deles?
O modelo da economia global deixa pouca margem para os conceitos de vida praticados nos anos 60, por exemplo, em que ainda era de lei a mulher ficar em casa e sobrava mais tempo para a vida conjugal. Hoje, essa área está em crise. Entre as muitas razões que levam ao fracasso do casamento tradicional, destaca-se a organização do trabalho. A tal ponto que a escritora e psicanalista francesa Corinne Maier se tornou famosa quando pôs o dedo na ferida. No seu livro Bom-dia Preguiça (versão francesa, 2004), lançou a polémica no meio empresarial, ao alertar os leitores para que façam o menos possível e não assumam responsabilidades no contexto laboral. Porquê? Porque nas empresas as pessoas se convertem em novos escravos, a quem se exige sempre mais a troco de um simples contrato de trabalho. A título de exemplo, refira-se que um executivo americano passa, anualmente, em média, 68 horas ao telefone e apenas 26 horas a ter relações sexuais.
O cenário tem uma dimensão expressiva nas grandes metrópoles do continente asiático: num universo repleto de gente anónima, os encontros assumem, com frequência, uma dimensão secundária relativamente às comunicações virtuais e às funções sociais de cada um.
No plano dos afectos, a realidade japonesa parece ter atingido um impasse, com cada vez mais mulheres solteiras – para quem a identidade já não passa por casar – e divorciadas. O cenário afigura-se temerário para o grupo dos homens casados, de tal forma que alguns decidiram criar uma associação para aprenderem a salvar os seus casamentos
No seu livro À Procura da Intimidade (Edições Asa, 2005), a psicóloga Maria Emília Costa explica por que é preciso que os cônjuges façam uma revisão das suas premissas de vida, de modo a não terem a impressão, tantas vezes incómoda e paralisante, de que investir na relação é sinónimo de perda de identidade.
Através dos casos que ilustram este dilema, a investigadora mostra como os modelos de intimidade espelham as regras com que aprendemos a amar desde a mais tenra infância – mesmo apesar da evolução dos modelos sociais, que defendem o crescimento individual. “Isto tem a ver com as heranças de valores, que se impõem ao discurso politicamente correcto”, esclarece a autora. Refere-se aos modelos culturais que são transportados para a educação. “Enquanto filhos, sabemos que é frequente, ainda, o pai perguntar ao filho adolescente quantas namoradas ele tem, mas se faz uma pergunta desse tipo à filha, é capaz de resumi-la ao singular (namorado)”, conclui. E isto “emperra” as melhores intenções liberalizantes, quer se queira quer não.
Este paradoxo entre ser igual e diferente, autónomo e dependente, afigura-se um verdadeiro quebra-cabeças para os homens. Alexandre Cruz Almeida, um brasileiro com 29 anos, com um site e um blog onde aborda com bastante humor as relações entre sexos, mostra, a partir de um detalhe quotidiano, aquilo a que chama esquizofrenia da mulher moderna: “Por um lado, a minha esposa quer que eu seja independente e saiba cuidar de mim; por outro, precisa que eu seja dependente dela – na forma como me apresento vestido, por exemplo – pois sabe que a sociedade a vai julgar como mulher se eu estiver com mau aspecto ou a camisa por passar.”
Em As Mulheres Querem Tudo , ele brinca com o facto de as mulheres emancipadas quererem por perto um homem Neandertal (forte e protetor), que seja também um gentleman, cheio de sensibilidade. “Elas nunca sabem que tipo de homem procuram, por isso escolhem um e tentam, em vão, mudá-lo; eles sabem exactamente a mulher que querem e não desejam que ela mude, reclamando logo quando elas querem mudanças.”
Voltando ao curso para homens, de Bob Gottfried – uma iniciativa que, por enquanto, não tem eco no nosso país –, pode revelar-se útil saber que “as mulheres querem sentir-se desejadas e precisas, falar de tudo um pouco com subjectividade, ter ao pé de si homens fortes mas que astratem com gentileza”. O mentor desta formação gratuita aconselha-os a fazerem aquelas pequenas coisas que eles não valorizam, mas que fazem toda a diferença para elas (arrumar o ketchup no sítio certo ou fechar a tampa da sanita, por exemplo). E dá algumas dicas para relaxar (exercícios respiratórios anti-stress), em vez de serem reactivos face a tais “miudezas”.
Se forem capazes de seguir o conselho – de homem para homem –, conseguirão que elas se sintam compreendidas e que façam por eles o que, no fundo, eles mais querem: “Serem reconhecidos por trabalharem a sério, serem poupados a sermões e queixas, terem o seu momento de sossego em momentos de stress, ter a graça de as ver fazer o que eles não gostam em casa, sair com os amigos e… claro, sexo.”
Excerto de artigo publicado na Revista Máxima
terça-feira, 25 de janeiro de 2011
Sexo no feminino
Jornalista, casada há 18 anos e com um filho, Sylvia de Béjar publicou mais de uma centena de artigos sobre relações de casal, sexualidade e psicologia em diversas revistas.
O seu livro é um convite à descoberta de si, nos relacionamentos íntimos.
Por Clara Soares
O que a motivou a escrever, num estilo tão directo e pessoal?
Li muito, consultei vários sexólogos e ginecologistas, falei com mulheres e escutei-me a mim mesma. Foi um ano e meio de trabalho que me absorveu completamente, a escrever e reescrever conteúdos, para ficar compreensível e sem falhas.
Quais foram as reacções ao livro?
Médicos e psicólogos têm-no recomendado aos clientes e chegaram a perguntar-me: “Como sabe isto?” Com conhecimento de causa, respondi: porque já experimentei com o meu marido. A resposta dos leitores – os homens também o leram! – não podia ser melhor. Para mim, também foi bom. Compensei tanto tempo de trabalho com uma semana de férias a dois num barco, em Ibiza, com muito amor e, claro, bom sexo (risos).
O que é o bom sexo?
A parte lúdica, que se joga por divertimento, de forma criativa e experimental. Como em qualquer jogo, só depois de se jogar – de se provar, no caso do sexo – é que se descobre do que se gosta e não se gosta, e se pode escolher modalidades, sem ter de repetir as que não agradam!
Isso não acontece na prática?
Acontece muito menos do que deveria acontecer. Muitas mulheres com quem falei levam muitas coisas para a cama e, quando estão a fazer amor, não tiram o devido partido do momento. Porque não se sentem à vontade e pensam no que está errado com elas, porque ficam ansiosas por poderem transpirar, por não terem as medidas que acham que deviam ter, entre outros detalhes. Com isso esquecem o lado divertido. Comportam--se como se não tivessem direito ao prazer. A atitude delas contrasta com a do sexo masculino, muito mais focado no gozo do que na mente.
As mulheres continuam prisioneiras da imagem?
É um facto. Quanto mais preocupadas, menos atentas à sua satisfação sexual. Por exemplo, uma mulher preocupada em esconder uns quilos a mais, quando se despe, não está totalmente presente. O parceiro sente e isso não é agradável. Gostaria que um homem que está a fazer amor consigo lhe dissesse: “Já viste a minha barriga?” Eles não vêem a celulite como nós, os pêlos, as estrias, querem alguém que esteja ali, envolvida no que está a fazer. Eles sentem-se valorizados com uma mulher que consegue entregar-se com gosto.
A falta de desejo delas tem a ver com o facto de os homens ignorarem aquilo que as satisfaz na intimidade? Numa sondagem feita em Espanha, verificou-se que 10% dos homens, independentemente da idade, afirmavam que procuravam dar prazer às suas parceiras. Perceberam que existem outros tipos de estimulação além do coito. O tempo que dura e as vezes que se faz são aspectos secundários.
A corrida ao orgasmo não é obrigatória...
O melhor é o durante. Muitas mulheres preferem satisfazer-se sozinhas porque não se satisfazem com os parceiros que já tiveram.
A monotonia conjugal é incontornável?
A sedução é uma capacidade que todos temos e requer inovação. Às vezes, basta passar a noite num lugar diferente, outras pode-se ficar pelo prazer de uma simples massagem, sem ter de fazer mais nada. Mas há também o dia em que um pode tocar mas o outro não. Quando se introduz um elemento de diferença, fazer amor ganha um sabor especial.
O que pode comprometer a espontaneidade no sexo?
Já pensou porque é que mais de metade das mulheres não deseja ter sexo com o cônjuge? Porque não se divertem. Nunca aprenderam, não sabem. A vida sexual é um processo que se aperfeiçoa ao longo da vida. Eu mesma, aos 40, gosto de coisas que antes não apreciava e de outras que nem sabia que existiam ou não me atrevia a dizer.
Por exemplo?
As fantasias. Muitas mulheres temem assumir que gostam de se sentir dominadas pelo homem quando fazem amor. Outras até o confessam às amigas, mas não a ele, por recearem que ele fique intimidado. Outras ainda por vergonha.
Que pensa do sexo sem envolvimento afectivo?
O sexo vale a pena se for feito com consciência e se tiver qualidade. Em nome do amor, muitas mulheres têm uma vida sexual sem qualidade. Amor e sexo não são a mesma coisa. O sexo com amor é a melhor coisa. Mas amor com mau sexo não é a mesma coisa.
Que sugere às mulheres que não se sentem sexualmente realizadas?
Que apostem numa atitude mais activa. Não adianta trocar de parceiro, imaginar que vai aparecer o Príncipe Encantado com a fórmula do prazer. A liberdade também é uma conquista pessoal a fazer, aprender a desfrutar-se, a tirar partido de si, e não apenas cuidar do lado cosmético.
Sylvia dixit
• O sexo começa no cérebro (a imaginação é um afrodisíaco)
• Prazer e autocensura não combinam
• A reconciliação com o espelho é vital para se sentir sexy
• Sexo e coito não são sinónimos
• A penetração vaginal não é suficiente (na maioria das mulheres) para alcançar o clímax
• 7 em cada 10 mulheres atingem o orgasmo pela estimulação do clítoris
• A estimulação manual (masturbação) é tão importante como outras práticas sexuais
• Sem conhecer bem o corpo (e o que o satisfaz) não se é dona da sua sexualidade
• Orgasmo e ejaculação masculina não são sinónimos (eles podem ejacular sem ter orgasmo ou alcançá-lo sem ejacular)
• Não há modelos sexuais ideais: cada mulher (e cada homem) deve criar o seu
• No sexo, querer controlar tudo é o mesmo que não se permitir desfrutar e aprender
• Pornografia, brinquedos sexuais, cibersexo e fantasias não são interditos, mas complementos saudáveis do prazer
• O bom sexo (oral, anal, coital) não é algo que lhe acontece mas algo que fazemos com que aconteça
Excerto de entrevista publicada na revista Máxima (2002)
O seu livro é um convite à descoberta de si, nos relacionamentos íntimos.
Por Clara Soares
O que a motivou a escrever, num estilo tão directo e pessoal?
Li muito, consultei vários sexólogos e ginecologistas, falei com mulheres e escutei-me a mim mesma. Foi um ano e meio de trabalho que me absorveu completamente, a escrever e reescrever conteúdos, para ficar compreensível e sem falhas.
Quais foram as reacções ao livro?
Médicos e psicólogos têm-no recomendado aos clientes e chegaram a perguntar-me: “Como sabe isto?” Com conhecimento de causa, respondi: porque já experimentei com o meu marido. A resposta dos leitores – os homens também o leram! – não podia ser melhor. Para mim, também foi bom. Compensei tanto tempo de trabalho com uma semana de férias a dois num barco, em Ibiza, com muito amor e, claro, bom sexo (risos).
O que é o bom sexo?
A parte lúdica, que se joga por divertimento, de forma criativa e experimental. Como em qualquer jogo, só depois de se jogar – de se provar, no caso do sexo – é que se descobre do que se gosta e não se gosta, e se pode escolher modalidades, sem ter de repetir as que não agradam!
Isso não acontece na prática?
Acontece muito menos do que deveria acontecer. Muitas mulheres com quem falei levam muitas coisas para a cama e, quando estão a fazer amor, não tiram o devido partido do momento. Porque não se sentem à vontade e pensam no que está errado com elas, porque ficam ansiosas por poderem transpirar, por não terem as medidas que acham que deviam ter, entre outros detalhes. Com isso esquecem o lado divertido. Comportam--se como se não tivessem direito ao prazer. A atitude delas contrasta com a do sexo masculino, muito mais focado no gozo do que na mente.
As mulheres continuam prisioneiras da imagem?
É um facto. Quanto mais preocupadas, menos atentas à sua satisfação sexual. Por exemplo, uma mulher preocupada em esconder uns quilos a mais, quando se despe, não está totalmente presente. O parceiro sente e isso não é agradável. Gostaria que um homem que está a fazer amor consigo lhe dissesse: “Já viste a minha barriga?” Eles não vêem a celulite como nós, os pêlos, as estrias, querem alguém que esteja ali, envolvida no que está a fazer. Eles sentem-se valorizados com uma mulher que consegue entregar-se com gosto.
A falta de desejo delas tem a ver com o facto de os homens ignorarem aquilo que as satisfaz na intimidade? Numa sondagem feita em Espanha, verificou-se que 10% dos homens, independentemente da idade, afirmavam que procuravam dar prazer às suas parceiras. Perceberam que existem outros tipos de estimulação além do coito. O tempo que dura e as vezes que se faz são aspectos secundários.
A corrida ao orgasmo não é obrigatória...
O melhor é o durante. Muitas mulheres preferem satisfazer-se sozinhas porque não se satisfazem com os parceiros que já tiveram.
A monotonia conjugal é incontornável?
A sedução é uma capacidade que todos temos e requer inovação. Às vezes, basta passar a noite num lugar diferente, outras pode-se ficar pelo prazer de uma simples massagem, sem ter de fazer mais nada. Mas há também o dia em que um pode tocar mas o outro não. Quando se introduz um elemento de diferença, fazer amor ganha um sabor especial.
O que pode comprometer a espontaneidade no sexo?
Já pensou porque é que mais de metade das mulheres não deseja ter sexo com o cônjuge? Porque não se divertem. Nunca aprenderam, não sabem. A vida sexual é um processo que se aperfeiçoa ao longo da vida. Eu mesma, aos 40, gosto de coisas que antes não apreciava e de outras que nem sabia que existiam ou não me atrevia a dizer.
Por exemplo?
As fantasias. Muitas mulheres temem assumir que gostam de se sentir dominadas pelo homem quando fazem amor. Outras até o confessam às amigas, mas não a ele, por recearem que ele fique intimidado. Outras ainda por vergonha.
Que pensa do sexo sem envolvimento afectivo?
O sexo vale a pena se for feito com consciência e se tiver qualidade. Em nome do amor, muitas mulheres têm uma vida sexual sem qualidade. Amor e sexo não são a mesma coisa. O sexo com amor é a melhor coisa. Mas amor com mau sexo não é a mesma coisa.
Que sugere às mulheres que não se sentem sexualmente realizadas?
Que apostem numa atitude mais activa. Não adianta trocar de parceiro, imaginar que vai aparecer o Príncipe Encantado com a fórmula do prazer. A liberdade também é uma conquista pessoal a fazer, aprender a desfrutar-se, a tirar partido de si, e não apenas cuidar do lado cosmético.
Sylvia dixit
• O sexo começa no cérebro (a imaginação é um afrodisíaco)
• Prazer e autocensura não combinam
• A reconciliação com o espelho é vital para se sentir sexy
• Sexo e coito não são sinónimos
• A penetração vaginal não é suficiente (na maioria das mulheres) para alcançar o clímax
• 7 em cada 10 mulheres atingem o orgasmo pela estimulação do clítoris
• A estimulação manual (masturbação) é tão importante como outras práticas sexuais
• Sem conhecer bem o corpo (e o que o satisfaz) não se é dona da sua sexualidade
• Orgasmo e ejaculação masculina não são sinónimos (eles podem ejacular sem ter orgasmo ou alcançá-lo sem ejacular)
• Não há modelos sexuais ideais: cada mulher (e cada homem) deve criar o seu
• No sexo, querer controlar tudo é o mesmo que não se permitir desfrutar e aprender
• Pornografia, brinquedos sexuais, cibersexo e fantasias não são interditos, mas complementos saudáveis do prazer
• O bom sexo (oral, anal, coital) não é algo que lhe acontece mas algo que fazemos com que aconteça
Excerto de entrevista publicada na revista Máxima (2002)
domingo, 23 de janeiro de 2011
A outra face do sexo
Fazer amor é uma porta de acesso para facetas de nós que desconhecemos. Os caminhos da libido passam pelos becos do encanto, da desilusão e da transformação interior. Desvende-os e descubra qual é o seu.
From Wong Kar-Wai's 1995 drama Fallen Angels
Por Clara Soares
“O que te leva a pensar que eu quero fazer amor contigo?” A reacção é comum nos labirintos da sociedade global, onde é impossível não encontrar sexo ao virar da esquina. Na democracia sexual, em que a diversidade de condutas é regra – e politicamente correcta –, ter um fuck buddy (amigo que, ocasionalmente, assume a função de parceiro sexual) é considerado normal, sobretudo nos meios urbanos e cosmopolitas. Se fazer amor é uma actividade natural, que gera – além de filhos – prazer e até alívio da tensão, por que razão se converteu num valor absoluto, ao ponto de ser massificada? Por que há cada vez mais aquilo que muitos apelidam de “obsessão contemporânea”, que leva a que o mais pequeno gesto de aproximação seja interpretado como luz verde para “passagem ao acto”?
O sexo é a droga nos novos tempos. Trabalhos sobre o assunto referem que cresce o número de pessoas que, dia sim, dia não, precisa de mais de um contacto sexual (real ou através da Internet), apesar de terem um parceiro regular. Eles começam a aparecer nas consultas de psiquiatria e psicoterapia. O mal-estar de que falava Freud revela-se mais presente que nunca. As obsessões, as fobias e a depressão que nos afligem são camufladas por doses regulares dessa droga que o corpo aprende a pedir para se anestesiar e aplacar carências e medos.“Eu bem sei, tenho uma pessoa que me ama, mas não resisto a ir para os chats (canais de conversa em tempo real na Internet), teclar com os meus admiradores virtuais e ali fico horas, não sei passar sem aquilo”, admite Júlia (nome fictício), de 30 anos, vendedora de espaço publicitário. “Aqui, conheço pessoas que de outro modo não conheceria.” Miguel (nome fictício), de 28 anos e trabalhador-estudante, é um incondicional do programa Messenger. O tempo livre é pouco e as pausas laborais são integralmente ocupadas a falar com quem aparece, até que se troca o número de telemóvel, até que se marca o encontro “e depois logo se vê, dá jeito ter alguém para ir comigo jantar e algo mais se houver clima, porque não?”Por que é que “ter alguém” – no sentido de consumar ou possuir – é um desejo tão comum e premente, como se dele dependesse a sobrevivência emocional?
Para os psicanalistas, as condutas sexuais exacerbadas ou disfuncionais são apenas a face visível das pulsões agresssivas inconscientes e mal canalizadas (libido ao serviço da auto-gratificação compulsiva). Quando o sexo é tudo, algo vai mal dentro de nós. Não é por acaso que a necessidade de admiração excessiva, a manipulação dos outros, as fantasias de poder e amores ideais e o sentimento de auto-importância fazem parte do que os psiquiatras convencionaram chamar “perturbações narcísicas da personalidade”.No manual de diagnóstico e classificação das perturbações do foro psiquiátrico, o sentimento de vazio, os relacionamentos instáveis e a impulsividade (agida pelo sexo, nas compras ou na voracidade alimentar) marcam as “personalidades limite”; as interacções de sedução sexual constante, a necessidade de ser sempre o centro das atenções e o exacerbar de emoções são reacções típicas dos que padecem de “perturbações histriónicas” de personalidade. E o sexo compulsivo aparece, mais recentemente, como uma subcategoria dos transtornos obsessivo-compulsivos.
A maioria dos cientistas e terapeutas, seja qual for o seu modelo de formação, é unânime quanto ao facto de o maior órgão sexual ser o cérebro, a sala de comando central que governa as nossas escolhas. Em caso de crise – frustrações, problemas emocionais e até existenciais –, o sexo é um veículo de expressão do corpo. Saturado de hormonas desgovernadas, o corpo anseia por libertá-las. A energia acumulada passa as barreiras da mente e, na forma mais instintiva e animal, os comportamentos eróticos e sexuais trazem à tona conflitos e facetas pessoais que estavam adormecidas, mantidas na sombra.
www.maxima.pt (in MSN)
From Wong Kar-Wai's 1995 drama Fallen Angels
Por Clara Soares
“O que te leva a pensar que eu quero fazer amor contigo?” A reacção é comum nos labirintos da sociedade global, onde é impossível não encontrar sexo ao virar da esquina. Na democracia sexual, em que a diversidade de condutas é regra – e politicamente correcta –, ter um fuck buddy (amigo que, ocasionalmente, assume a função de parceiro sexual) é considerado normal, sobretudo nos meios urbanos e cosmopolitas. Se fazer amor é uma actividade natural, que gera – além de filhos – prazer e até alívio da tensão, por que razão se converteu num valor absoluto, ao ponto de ser massificada? Por que há cada vez mais aquilo que muitos apelidam de “obsessão contemporânea”, que leva a que o mais pequeno gesto de aproximação seja interpretado como luz verde para “passagem ao acto”?
O sexo é a droga nos novos tempos. Trabalhos sobre o assunto referem que cresce o número de pessoas que, dia sim, dia não, precisa de mais de um contacto sexual (real ou através da Internet), apesar de terem um parceiro regular. Eles começam a aparecer nas consultas de psiquiatria e psicoterapia. O mal-estar de que falava Freud revela-se mais presente que nunca. As obsessões, as fobias e a depressão que nos afligem são camufladas por doses regulares dessa droga que o corpo aprende a pedir para se anestesiar e aplacar carências e medos.“Eu bem sei, tenho uma pessoa que me ama, mas não resisto a ir para os chats (canais de conversa em tempo real na Internet), teclar com os meus admiradores virtuais e ali fico horas, não sei passar sem aquilo”, admite Júlia (nome fictício), de 30 anos, vendedora de espaço publicitário. “Aqui, conheço pessoas que de outro modo não conheceria.” Miguel (nome fictício), de 28 anos e trabalhador-estudante, é um incondicional do programa Messenger. O tempo livre é pouco e as pausas laborais são integralmente ocupadas a falar com quem aparece, até que se troca o número de telemóvel, até que se marca o encontro “e depois logo se vê, dá jeito ter alguém para ir comigo jantar e algo mais se houver clima, porque não?”Por que é que “ter alguém” – no sentido de consumar ou possuir – é um desejo tão comum e premente, como se dele dependesse a sobrevivência emocional?
Para os psicanalistas, as condutas sexuais exacerbadas ou disfuncionais são apenas a face visível das pulsões agresssivas inconscientes e mal canalizadas (libido ao serviço da auto-gratificação compulsiva). Quando o sexo é tudo, algo vai mal dentro de nós. Não é por acaso que a necessidade de admiração excessiva, a manipulação dos outros, as fantasias de poder e amores ideais e o sentimento de auto-importância fazem parte do que os psiquiatras convencionaram chamar “perturbações narcísicas da personalidade”.No manual de diagnóstico e classificação das perturbações do foro psiquiátrico, o sentimento de vazio, os relacionamentos instáveis e a impulsividade (agida pelo sexo, nas compras ou na voracidade alimentar) marcam as “personalidades limite”; as interacções de sedução sexual constante, a necessidade de ser sempre o centro das atenções e o exacerbar de emoções são reacções típicas dos que padecem de “perturbações histriónicas” de personalidade. E o sexo compulsivo aparece, mais recentemente, como uma subcategoria dos transtornos obsessivo-compulsivos.
A maioria dos cientistas e terapeutas, seja qual for o seu modelo de formação, é unânime quanto ao facto de o maior órgão sexual ser o cérebro, a sala de comando central que governa as nossas escolhas. Em caso de crise – frustrações, problemas emocionais e até existenciais –, o sexo é um veículo de expressão do corpo. Saturado de hormonas desgovernadas, o corpo anseia por libertá-las. A energia acumulada passa as barreiras da mente e, na forma mais instintiva e animal, os comportamentos eróticos e sexuais trazem à tona conflitos e facetas pessoais que estavam adormecidas, mantidas na sombra.
www.maxima.pt (in MSN)
Sou Bissexual. É normal!
A cortina de ferro entre heterossexuais e homossexuais está a ruir.
"Sou bi. E daí?”
Clara Soares
Há quatro anos, a cantora brasileira Ana Carolina revelou publicamente a sua preferência por ambos os sexos, garantindo ser mais feliz assim. A cantora canadiana Alanis Morissette já o havia feito, pouco tempo antes, e a onda de revelações começou a ganhar corpo. Na música, Ricky Martin, Pink, Netinho. No cinema, Angelina Jolie, Lindsey Lohan, Tila, Megan Fox. Esta terceira via, que desconcerta a mentalidade dominante – “É-se uma coisa (hetero) ou outra (gay)” –, começa a conquistar um espaço próprio nas conversas, nos fóruns virtuais, nas vidas privadas e nas mentalidades. Séries (Anatomia de Grey, Letra L, Sexo e a Cidade) e filmes (Henry & June, Batman, Matrix, Vicky Cristina Barcelona) não dispensam personagens sexualmente ambíguas. A bissexualidade é um fenómeno passageiro, um problema de identidade ou o reflexo de uma nova atitude nos relacionamentos?
Desde a Antiguidade Clássica que há registo desta forma de relacionar-se. Nos anos 40, o primeiro grande estudo sobre sexualidade humana, liderado pelo investigador Alfred Kinsey, revelou que nove por cento dos americanos eram bissexuais. E desde 1993 que estas orientações deixaram de constar na Classificação Internacional de Doenças, como transtornos de personalidade. O que antes se considerava desviante é hoje uma opção comportamental, decorrente daquilo que uma pessoa sente (mais do que o que faz e com quem). Após a emancipação das mulheres e a conquista de direitos dos gays, a ambiguidade sexual é a nova fronteira a explorar. Ou a temer, constituindo uma ameaça à ordem social estabelecida. Apesar dos movimentos activistas e do Dia da Celebração Bissexual (23 de Setembro), sentir envolvimento físico ou emocional sem a barreira do género é ainda uma ficção para o comum dos mortais.
Homens e mulheres parecem ter representações mentais distintas acerca da sua identidade sexual, tida como mais ampla. O psiquiatra Júlio Machado Vaz admite que nenhuma teoria é satisfatória neste campo e esclarece: “Sim, a bissexualidade existe, mas é normal que angustie; não é por acaso que, até há algum tempo, certos grupos homossexuais consideravam que os bissexuais eram gays não assumidos.” Membro da Sociedade de Sexologia Clínica, Machado Vaz adianta que esta orientação é menos angustiante e ameaçadora para a identidade no caso das mulheres. Camille Paglia, autora de Sexual Personae: Art and Decadence from Nefertiti to Emily Dickinson (1990), refere que existem mais mulheres bi do que homens: elas têm maior apetência para integrar sexo e afecto e com menos traumas.
Independentemente das diferenças de trajectória, o número de homens e mulheres que optam pela ambiguidade sexual está a ganhar visibilidade e há quem assegure tratar-se de uma nova revolução (e não de uma mera tendência): a da flexibilidade e da abrangência, afectiva ou sexual. Maria del Mar, psicóloga e terapeuta holística, em Lisboa, refere que nos últimos oito anos tem acompanhado homens e mulheres de 30 e 40 anos que descobriram a sua bissexualidade, geralmente na sequência de fracassos amorosos. “Começam por viver [mais elas do que eles] uma relação homossexual intensa que dura, em média, três a cinco anos; aí encontram uma forma de satisfazer necessidades que não conseguiam preencher, até então, com o sexo oposto (nem no seio da família de origem).” Uma opção compensatória natural que, embora enriquecedora, leva tempo a ser admitida e vivida com harmonia e maturidade no quotidiano, acrescenta.
A última tendência na comunidade científica encaminha-se para a hipótese de estarmos a assistir, globalmente, a uma postura mais aberta face à atracção, ao amor e aos relacionamentos. Em entrevista à BBC, o médico e ex-ministro da Saúde italiano, Umberto Veronesi, considerou que “será, em três gerações, apenas uma demonstração de afecto, rumo à bissexualidade.
www.maxima.pt
"Sou bi. E daí?”
Clara Soares
Há quatro anos, a cantora brasileira Ana Carolina revelou publicamente a sua preferência por ambos os sexos, garantindo ser mais feliz assim. A cantora canadiana Alanis Morissette já o havia feito, pouco tempo antes, e a onda de revelações começou a ganhar corpo. Na música, Ricky Martin, Pink, Netinho. No cinema, Angelina Jolie, Lindsey Lohan, Tila, Megan Fox. Esta terceira via, que desconcerta a mentalidade dominante – “É-se uma coisa (hetero) ou outra (gay)” –, começa a conquistar um espaço próprio nas conversas, nos fóruns virtuais, nas vidas privadas e nas mentalidades. Séries (Anatomia de Grey, Letra L, Sexo e a Cidade) e filmes (Henry & June, Batman, Matrix, Vicky Cristina Barcelona) não dispensam personagens sexualmente ambíguas. A bissexualidade é um fenómeno passageiro, um problema de identidade ou o reflexo de uma nova atitude nos relacionamentos?
Desde a Antiguidade Clássica que há registo desta forma de relacionar-se. Nos anos 40, o primeiro grande estudo sobre sexualidade humana, liderado pelo investigador Alfred Kinsey, revelou que nove por cento dos americanos eram bissexuais. E desde 1993 que estas orientações deixaram de constar na Classificação Internacional de Doenças, como transtornos de personalidade. O que antes se considerava desviante é hoje uma opção comportamental, decorrente daquilo que uma pessoa sente (mais do que o que faz e com quem). Após a emancipação das mulheres e a conquista de direitos dos gays, a ambiguidade sexual é a nova fronteira a explorar. Ou a temer, constituindo uma ameaça à ordem social estabelecida. Apesar dos movimentos activistas e do Dia da Celebração Bissexual (23 de Setembro), sentir envolvimento físico ou emocional sem a barreira do género é ainda uma ficção para o comum dos mortais.
Homens e mulheres parecem ter representações mentais distintas acerca da sua identidade sexual, tida como mais ampla. O psiquiatra Júlio Machado Vaz admite que nenhuma teoria é satisfatória neste campo e esclarece: “Sim, a bissexualidade existe, mas é normal que angustie; não é por acaso que, até há algum tempo, certos grupos homossexuais consideravam que os bissexuais eram gays não assumidos.” Membro da Sociedade de Sexologia Clínica, Machado Vaz adianta que esta orientação é menos angustiante e ameaçadora para a identidade no caso das mulheres. Camille Paglia, autora de Sexual Personae: Art and Decadence from Nefertiti to Emily Dickinson (1990), refere que existem mais mulheres bi do que homens: elas têm maior apetência para integrar sexo e afecto e com menos traumas.
Independentemente das diferenças de trajectória, o número de homens e mulheres que optam pela ambiguidade sexual está a ganhar visibilidade e há quem assegure tratar-se de uma nova revolução (e não de uma mera tendência): a da flexibilidade e da abrangência, afectiva ou sexual. Maria del Mar, psicóloga e terapeuta holística, em Lisboa, refere que nos últimos oito anos tem acompanhado homens e mulheres de 30 e 40 anos que descobriram a sua bissexualidade, geralmente na sequência de fracassos amorosos. “Começam por viver [mais elas do que eles] uma relação homossexual intensa que dura, em média, três a cinco anos; aí encontram uma forma de satisfazer necessidades que não conseguiam preencher, até então, com o sexo oposto (nem no seio da família de origem).” Uma opção compensatória natural que, embora enriquecedora, leva tempo a ser admitida e vivida com harmonia e maturidade no quotidiano, acrescenta.
A última tendência na comunidade científica encaminha-se para a hipótese de estarmos a assistir, globalmente, a uma postura mais aberta face à atracção, ao amor e aos relacionamentos. Em entrevista à BBC, o médico e ex-ministro da Saúde italiano, Umberto Veronesi, considerou que “será, em três gerações, apenas uma demonstração de afecto, rumo à bissexualidade.
www.maxima.pt
Subscrever:
Mensagens (Atom)