A proximidade mata o amor? Para algumas pessoas, sim. Outras vêem-na como um combustível vital para a sua sobrevivência.
Imagem do filme 'Closer'
Por Clara Soares
As suas mentes cruzaram-se num blogue, trocaram impressões e desafios no Messenger e viveram emoções intensas no segundo encontro face-a-face. Foi-se criando uma rotina confortável, alternando a vida a solo e os momentos de partilha de espaços privados. “Na minha casa ou na tua?” Mariana e Miguel, divorciados e sem filhos, vivem a alguns quilómetros de distância um do outro. De um momento para o outro, começaram as discussões em torno do espaço entre eles. Miguel começou a enjoar tanta proximidade e a dar sinais de distância, tinha a impressão de a ver entrar um pouco mais dentro dos seus assuntos pessoais, reivindicando mais a presença dele. As partes envolvidas começam por bem se querer e vivem descontraidamente as delícias da paixão; quando esta abranda, começam a ver-se sem os efeitos inebriantes das hormonas. E é nesse momento que as fronteiras de cada um começam a definir-se e a tornar-se conscientes. Acaba-se o “dois-em-um” e começa o “eu não sou o outro.” Se esta fase de discórdia e desencontro não for dissecada pelos dois, não há relação que resista, porque a liberdade de um implica sempre o sacrifício do outro.
Aos 37 anos, Mariana ainda recorda este caso de amor, vivido há dois anos. “Não entendo porque é que certas pessoas têm tanta relutância a viver em conjunto; e logo começam com a conversa do espaço”, critica. Hoje, orgulha-se de estar a viver ao lado de outro homem que a “bem-quer”, embora sinta algumas saudades do tempo em que esteve sozinha. Em certa medida, até compreendia o Miguel, dois anos mais novo e saído de um divórcio quando se conheceram: “A vida sem compromissos tem os seus encantos e estimula-nos a ir à procura do que nos possa dar novidade e outro fôlego.” Porém, diz não dispensar as alegrias mornas da vida a dois, sem a qual a sua vida carece de sentido.A nostalgia de Mariana é um sentimento comum a muitas mulheres para quem a vida só tem sentido se for vivida ao lado de alguém. Pode até não ser o melhor amante do mundo, pode limitar-nos a liberdade e nós até deixarmos, pouco importa se em troca se tiver um ombro amigo que faça a gente sentir-se mais gente aos olhos do mundo. Os psicólogos sociais chamam-lhe solidão acompanhada, uma falsificação do amor. Os filósofos consideram tratar-se de um problema existencial. “Se o outro serve apenas para a satisfação dos nossos desejos, então não o vemos como pessoa, amamos egoisticamente e acabamos por sentir que nos falta sempre alguma coisa.” Quem o afirma é o filósofo Lou Marinoff. Quando esteve em Portugal, o autor do livro "Mais Platão, Menos Prozac" (Editorial Presença) acrescentou: “As pessoas que se sentem rejeitadas fazem a sua felicidade depender do outro, mas não percebem que a realização pessoal só se encontra dentro delas.”
O aconselhamento filosófico, actualmente em voga nos Estados Unidos, parece estar a dar resposta a necessidades e questões que não são puramente psicológicas ou emocionais, mas existenciais. “Hoje é comum as pessoas terem crises de identidade porque a sociedade da informação mecanizou o espírito, retirando energia e a capacidade para a reflexão. A crescente crise que afecta os relacionamentos advém da incapacidade para parar.”No outro prato da balança situam-se os parceiros que estão sempre em fuga. Entre as formas de mal-me-querer, destaca-se aquela em que se põem sempre os outros à distância, simplesmente por medo de se ficar confinado a quaisquer vínculos. Mas neste caso, admite Lou Marinoff, o problema é mais de ordem psicológica e social. Psicanalistas famosas, como Susie Orbach (foi terapeuta da princesa Diana) defendem que, na base dos processos de rejeição – seja quem afasta ou se sente afastado –, existem sentimentos de desconfiança e incompreensão e o medo (ou a necessidade extrema) de fusão de identidades, como o experimentado desde a mais tenra infância. A separação das águas impõe-se em qualquer relação madura, para não comprometer ou ameaçar a expressão saudável da individualidade.
www.maxima.pt (in MSN)
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