quarta-feira, 30 de julho de 2014
O segredo para a crise está na comunidade
À conversa com Fernando Alves, em mais uma edição de Portugueses Excelentíssimos, na TSF, Moisés de Lemos Martins é um homem que merece a pena ouvir. O professor catedrático da Universidade do Minho e fundador do Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade tem uma firme convicção:
«O meu compromisso tem que estar com a comunidade. A comunidade é outra coisa que não a tribo. O tribalismo é um outro nome para o individualismo, 'sou eu e aqueles que são como eu'. A comunidade é outra coisa. É misturando o passado, o presente e o futuro de nós mesmos que fazemos a comunidade. A crise da comunidade é também a crise humana.» Ouvir a entrevista aqui
quinta-feira, 3 de julho de 2014
«O que conta é ter uma vida mais livre e autêntica»
(publicado na VISÃO 1110 de 12 de Junho)
O psicanalista Carlo Strenger diz, em entrevista à VISÃO, que a existência só ganha sentido pela aceitação dos limites próprios e na gestão das crises, sem embarcar na ilusão da imortalidade.
Veja o Vídeo
O psicanalista Carlo Strenger diz, em entrevista à VISÃO, que a existência só ganha sentido pela aceitação dos limites próprios e na gestão das crises, sem embarcar na ilusão da imortalidade.
Veja o Vídeo
É israelita. É psicanalista. E tem um cão chamado Freud. Um
ano depois de ter lançado, em Portugal, O
Medo da Insignificância (Ed. Lua de papel, 295pág., €14,90), que já vendeu
três mil exemplares, o autor acolheu a VISÃO, via Skype, em Telavive, onde
reside com a mulher, psicóloga política. Na sala de estar, com paredes
«forradas» de livros, o professor universitário disserta sobre o impacto da
globalização na identidade. O pânico existencial e o sentido da vida são temas de
eleição nos seus livros, artigos e colunas publicadas na imprensa, mas também
nas palestras internacionais (incluindo a famosa TEDxJaffa, sobre cidadania
global, com mais de um milhão de visualizações). Aos 55 anos, define-se como um
epicurista que não acredita em Deus. Prefere que o vejam como um liberal
secular e tem fé na capacidade do Homo
Globalis para cooperar e reduzir abismos forjados por visões do mundo
fechadas, que não passam de «uma estratégia de defesa contra a consciência da
morte.»
Começo por
citá-lo: «Não existem garantias de que a nossa vida corra bem». Porque tememos
a insignificância?
Os avanços tecnológicos levaram-nos a cultivar,
erradamente, a noção de que temos controlo pleno das nossas vidas e do que
acontece à nossa volta, mas continuamos a ser tão frágeis, talvez um pouco
menos, do que éramos na Grécia Antiga.
Isso quer dizer
que a psicologia positiva tem os dias contados?
Não estou a questionar esse campo do saber, bem
fundamentado cientificamente. Refiro-me à psicologia pop, que cria falsas
esperanças com ideias simplistas e omnipotentes. Por exemplo, se acreditar em
si, será rico, famoso e belo. Se tal não sucede, fica-se a pensar: «Algo
profundamente errado está a passar-se comigo.»
Alcançar o sucesso
global é hoje um imperativo. Se não se for célebre, é-se um Zé Ninguém?
Isso acontece porque estamos numa cultura de informação-entretenimento,
assente na tecnologia. Ela democratizou o conhecimento – basta pensar no Google
– mas trouxe algum caos. Ficámos sem as referências que davam, até então, um
valor às nossas vidas e substituímo-las pela fama: na música, no
empreendedorismo, no futebol.
Confundimos o ter
uma carreira com o ter uma vida com sentido?
A questão é que precisamos ter mais consciência da nossa
mortalidade. Essa evidência torna-se clara quando atingimos a maturidade, mas
pode acontecer antes. É o caso do jovem bem-sucedido, que tem o curso, o
emprego de sonho, a casa e o carro, mas falta-lhe significado.
A sua carreira,
por exemplo. Que significa para si e em que medida tem a ver consigo?
Encaro-a como uma espécie de chamamento. Sinto-me um
sortudo por fazer algo que me apaixona. Uma das experiencias mais marcantes da
minha vida foi ter crescido numa família judia ultra ortodoxa. Na adolescência
comecei a ter sérias dúvidas acerca do judaísmo e da religião em geral.
Tornei-me num secularista liberal, o que não foi nada fácil de aceitar para os
meus pais. Inclusivamente, chegaram a não querer relacionar-se comigo. Isto
mudou a minha vida de forma profunda, porque prezo muito a liberdade individual
e de pensamento, bem como o uso da razão crítica. Tornou-se um tema central da minha
vida pessoal e converti isso numa profissão.
Como define o
significado existencial do Homo Globalis,
ou cidadão do século XXI?
O que conta é que a pessoa consiga ter uma vida mais
livre e autêntica. Há quem pense que a liberdade é ter tudo o que se quer. Para
mim, é sobre o que é a essência humana, que implica escolhas difíceis. Por
exemplo, a ideia de liberdade para conduzir uma certa forma de vida traduziu-se
na escolha, minha e da minha mulher, de não sermos pais.
Defende que só
podemos ser livres quando aceitamos os nossos limites. Porquê?
Refiro-me ao aceitar ativamente o que não somos, à tomada
de consciência dos nossos limites, em vez de nos agarrarmos á ideia de que
temos um potencial ilimitado, a lógica do «Just do it». Erradamente, pensa-se
que o dinheiro, a fama e o poder trazem significado à existência, sem
questionar se essa vida é, realmente, a nossa.
Esse dilema surge
com frequência no seu consultório?
Sem dúvida. Quem chega ao topo não afasta de cena a
procura de sentido. Perceber estes limites liberta-nos da ansiedade e da culpa
pelas oportunidades perdidas na cultura orientada para o sucesso. Um dos meus
pacientes acabou por enriquecer rapidamente e, quando acordava de manhã,
pensava: «Conquistei tudo o queria… e agora? O que vou fazer?»
Como se faz esta
mudança de paradigma ao nível coletivo?
É preciso algum treino para entender que a meta de um
cidadão do mundo não é ser conhecido por todos, mas contribuir para um projeto que
envolva a humanidade como um todo. Somos um sistema complexo e especializado,
que pressupõe, para evoluir, cooperação e interdependência, para que todas as
partes ganhem.
Defende que o
desdém civilizado é preferível ao politicamente correto. Porquê?
Quando estava num programa de entrevistas sobre política
na estação de radio mais ultra ortodoxa de Israel, houve um debate em que usei
esse termo. Quando o tema é, por exemplo, a pena de morte ou os direitos dos
homossexuais, faz para mim mais sentido discordar civilizadamente com alguém que
respeito como ser humano, mas sem ter de fingir que não me incomodam as suas
ideias, que vão contra os meus valores e consciência.
Como ex membro do
Painel de Monitorização do Terrorismo na Federação Mundial de Cientistas (WFS),
está otimista quanto ao fim do conflito israelo-palestiniano, entre outros?
Segundo a teoria dos jogos, trata-se de um jogo de soma
zero: ambas as partes perdem. Estamos a assistir à batalha pela cultura
dominante e não posso prever como vai acabar este confronto civilizacional. A
primavera árabe converteu-se num caos e a luta entre sunitas e xiitas é
dramática. Podiam ter ganhos mútuos – principio não zero, um conceito do meu
colega Robert Wright – mas ficam reféns de sistemas de crenças irracionais.
Para os cidadãos, é uma história de horror.
Subscrever:
Mensagens (Atom)