quinta-feira, 2 de setembro de 2010

DOMINGO


«Tenha um dia descansado», diz a senhora que serve a bica. Num domingo, às duas da tarde, há gente que ainda dorme, após uma noite de paixão. Gente a fazer o «passeio dos tristes». Gente que aguarda a hora do futebol na tv. Gente a cumprir tarefas pendentes, desde idas ao supermercado a exercícios de corpo e mente, nem que seja de aspirador na mão.


Descansar é deixar de cansar-se. Dar sossego à compulsão de sair, de estar sempre em boa (ou má) companhia. Nos bairros do amor virtual, multiplicam-se as tentativas de encontros: mesmo que as probabilidades de ganhar sejam idênticas às do Euromilhões, uma imensa minoria de solitários urbanos testa regularmente a sua sorte.

Entregues às leis do acaso, procuram novos momentos, para afastar pensamentos. Sossegam a dor quando fazem amor. Fazem-no, mas nem sempre o sentem. E raramente o encontram. «Algumas pessoas não querem aproximar-se muito», sussurra uma jovem sozinha, à mesa de um bar (a cena é do do filme Anjos Caídos, do realizador chinês Wang Kar Wai). E pensa num homem.

«Quando se sabe muito acerca de uma pessoa, perde-se o interesse», confessa a jovem, para a câmara. Di-lo porque acredita ou porque recusa o sabor do desânimo? No mercado dos afectos, as ausências racionalizam-se, por assim doerem menos. No final do dia, despe-se a pele domingueira e fecham-se os olhos. Entra-se, finalmente, em modo off. «Amanhã é outro dia».

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